sexta-feira, 15 de março de 2024

Campo Grande: o meu lugar

 

 
O que é o lugar? Qual é o seu lugar?
No senso comum, lugar pode ser entendido como sinônimo de localização. Seguindo os conceitos geográficos, a definição de lugar pode ser entendida como localidades, região de referência, entre outros exemplos. 
Já em um outro ponto de vista, o lugar para a geografia, principalmente seguindo contribuições de autores como Yi-Fu Tuan, numa corrente filosófica da fenomenologia, da geografia humanística, a ideia de lugar associa-se a significação, pertencimento àquele espaço, identidade, simbolismo e afeto com determinado local.
Dessa forma, uma rua, ou uma praça que lhe traz boas lembranças, como as relacionadas à infância, ou a minha casa, ou mesmo um bairro ou uma cidade em que me sinto bem, pode ser considerado o "meu lugar". As experiências vividas pelos indivíduos ou grupos sociais, deixando suas marcas em algum espaço, que hora ou outra voltam às nossas memórias.
Isso fica evidente na letra da música "Meu lugar", de Arlindo Cruz e Mauro Diniz, na qual é citado:
"O meu lugar é caminho de Ogum e Iansã... O meu lugar é cercado de luta e suor... O meu lugar tem meus mitos e seres de luz... O meu lugar é sorriso, é paz e prazer... Ai, meu lugar tem mil coisas pra gente dizer, o difícil é saber terminar... Madureira..."
A canção deixa claro a relação de sentimento e pertencimento ao bairro de Madureira, sendo assim o "seu lugar".
Por outro lado há uma discussão em torno de um outro conceito ou categoria, que seria o não-lugar, ou deslugar. Nessa definição, estaria o contrário de lugar, remetendo à ausência de identidade e referências com determinado espaço, não possuindo significados, sendo indiferente, locais de passagem, que não criam vínculo, ou até despertando aversão.
Nesse contexto, um exemplo que poderia ser citado é a canção "Lugar nenhum", do grupo Titãs. Segue a letra:
"Não sou brasileiro, não sou estrangeiro. Não sou de nenhum lugar, sou de lugar nenhum.
Não sou de São Paulo, não sou japonês. Não sou carioca, não sou português. Não sou de Brasília, não sou do Brasil. Nenhuma pátria me pariu..."
Dessa forma, os autores deixam bem claro que não se identificam e não se sentem pertencentes a nenhum local, cidade, estado ou país. Um exemplo de não-lugar, ou deslugar.
Trazendo a questão para o bairro de Campo Grande, percebemos muitas modificações no espaço, fazendo com que, ao revisitarmos os "nossos lugares" na atualidade, podemos descobrir novos significados, consequentemente, novas identidades, frutos das transformações, já que esse espaço é construído na percepção de mundo vivido, com dinamismo, se recriando os locais, numa relação entre o ser humano, o Estado, as corporações e a natureza.
Quem não se lembra dos saudosos Luso-brasileiro, Belisário dos Santos, Silbene, entre outros símbolos do passado campograndense?
Porém, mesmo que uma localidade passe por uma transformação frenética, uma urbanização selvagem, é provável que algo pretérito fique conservado. Mesmo que não seja físico, mas na memória daqueles que testemunharam o feito.
E aí? alguma parte do bairro de Campo Grande é o seu lugar? Ou Campo Grande como um todo é o seu lugar? Algum lugar seu foi modificado? Restou alguma coisa do seu lugar? Algum local virou um não-lugar?

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9 comentários:

  1. Um ótimo escritor, adorei o livro "A lenda do vulcão do Mendanha", estou ansiosa para ler seu livro novo.

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    1. Oi, Maria. Muito obrigado. Espere que leia e goste. Se puder, comente sobre o artigo aí de cima. Desde já, agradeço. Um abraço.

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  2. Você não pense mulher
    Que me convence
    A deixar o meu bairro
    Pelo seu olhar profundo....
    Parte da letra de Meu bairro, de Adelino Moreira, cantada por Nelson Gonçalves

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    1. Show, meu amigo. Essa canção é linda, do nosso grande campograndense Adelino Moreira, bem interpretada pelo vozeirão do Nelson Gonçalves e ainda exalta nossa região. Muito bom! Muito obrigado pela visita ao blog. Um grande abraço.

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  3. Pertencer a um lugar, com as imediatas modificações urbanas, acaba ficando para os que ainda trazem memórias afetivas e para os que perpetuam essas memórias em textos de literatura física ou virtual.
    As novas gerações foram estimuladas a pertencer ao mundo, não se apegando aos lugares de nascimento, de crescimento, infelizmente.
    Em Campo Grande, o que observamos, além dessa geração que não encontra significação de pertencimento local, temos ainda o crescimento desordenado e as novas famílias que aqui chegam nada encontram de suas origens, deixando o amor ao bairro em segundo plano, apenas participando o menor índice de violência (área central do bairro) da cidade do Rio de Janeiro. (Oxalá assim permaneça!).
    Resta aos 'da terra' ensinar aos rebentos próprios o amor pelo lugar, a necessidade de cuidar do espaço, para que a harmonia permaneça.
    A modernidade e a especulação imobiliária, infelizmente, trouxeram a Campo Grande o aumento da temperatura de um lugar que já foi estância climática, eliminando áreas verdes e retirando as árvores das calçadas, para que as mesmas se transformem em estacionamento ou vitrine para as lojas que surgem.
    Para exemplificar essa tristeza toda, do West Shopping ao Viaduto Alim Pedro, na calçada direita, só encontramos três árvores. É uma as áreas mais inóspitas de Campo Grande, com a presença apenas de cimento e asfalto.
    Saudade do verde, da sensação de pertencimento e acolhimento de um lugar que ainda tem suas belezas e ainda abriga um grupo de pessoas excepcionais.
    Parabéns pelo belo Blog.

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    1. Uau, meu amigo! Que comentário! Muito obrigado como você expõe bem a intenção do artigo, de trazer essa questão das modificações no bairro de Campo Grande, atingindo nossos "lugares", que, infelizmente, como você bem citou, vão ficando só na memória. Será que esse trecho que você mencionou, do West Shopping ao viaduto Alim Pedro, não seria hoje um não-lugar? Fica o debate. Muitíssimo obrigado pela sua enriquecedora contribuição. Um grande abraço.

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    2. Uau, meu amigo! Que comentário! Muito obrigado como você expõe bem a intenção do artigo, de trazer essa questão das modificações no bairro de Campo Grande, atingindo nossos "lugares", que, infelizmente, como você bem citou, vão ficando só na memória. Será que esse trecho que você mencionou, do West Shopping ao viaduto Alim Pedro, não seria hoje um não-lugar? Fica o debate. Muitíssimo obrigado pela sua enriquecedora contribuição. Um grande abraço.

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  4. Muito além das questões geográficas, meu amor por Campo Grande ultrapassa limites físicos, embora os espaços verdes da infância, os campinhos e enormes quintais arborizados e cheios de pés de frutas sejam memórias recorrentes. Vivo a explosão demográfica do presente me ressentindo da ausência de famílias à tarde nas calçadas, das crianças brincando nas ruas, num tempo menos apressado onde era mais fácil ser feliz. Viver o presente nos sintoniza com os imediatismos de ruas apinhadas de gentes e carros, comércio intenso sob uma temperatura muito elevada, diante da degradação ambiental que fez do bairro Verde um lugar de poucas ruas arborizadas e da verticalização de antigas moradias. Os tempos mudaram, exigiram que nós também mudássemos, mas o velho amor pelo meu lugar continua o mesmo. É no ritmo de Campo Grande que bate o meu coração. Posso estar em qualquer outro lugar , mas é para cá sempre que meu coração quer voltar.

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    1. É, minha querida amiga, Campo Grande mudou e continuo mudando, mudando os nossos lugares, com as frenéticas transformações urbanas. E o seu amor por Campo Grande não está além das questões geográficas, mas sim implícitas nelas, já que ao mencionar as suas memórias do seu lugar, está relacionando-as ao espaço geográfico modificado, afetando o seu lugar. Muito obrigado pela visita ao blog. Um grande abraço.

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