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quarta-feira, 14 de agosto de 2024
"Causos" de minha avó
"CAUSOS" DE MINHA AVÓ
Ah, que saudade de sentar e ouvir minha saudosa avó Julia contar seus "causos "! Mesmo assustadores, aqueles contos me atraiam como um ímã, me despertando, ao mesmo tempo, medo e fascínio.
Adorava ouvir aquelas histórias que, sendo verdade ou não, me introduziam para um cenário bem real, principalmente porque a narração de minha avó materna era de um roteiro impecável.
E as histórias eram diversificadas. Tinham as tradicionais sobre Lobisomem, em suas noites de lua cheia; as de Mula sem cabeça, a famosa "mulher do padre"; o Saci-pererê, que me contavam (não só minha avó) que assoviava e perturbava os cavalos; entre outros relevantes personagens que permeavam o imaginário (ou realidade) dos "mais antigos ". Tinha até um ser que minha avó chamava de "Mão Pelada", o qual ela falava que ocasionalmente visitava nosso quintal, que só mais tarde soube que era um animal de verdade (mas nunca soube se ele realmente algum dia esteve em nossa casa).
Entre tantos "causos", lembro-me até hoje de um específico. Minha avó relatou mais ou menos assim:
"Numa certa noite, eu e um amigo vínhamos caminhando por um campo aberto, sem ninguém, com poucas casas e iluminação, voltando para casa. Entre uma conversa e outra, avistamos um homem parado perto de uma ponte onde passaríamos. Era um homem bem alto, sem movimentos, muito estranho. Pensamos em voltar, mas não havia outro caminho, e até porque era apenas um homem. Pois então, fomos ao encontro do tal ser, tentando evitar olhá-lo. Quando passamos por ele, ao darmos 'Boa noite', cometemos o erro de olharmos para ele. E... surpresa! A parte de cima dele estava coberta por uma espécie de névoa. Não dava pra ver a cabeça do homem! Corremos tanto que chegamos à casa mais rápido do que o esperado. É... meu filho, a noite tem muitos mistérios, é quando os 'bichos' ficam soltos."
Pronto! Ali era um misto de medo e satisfação por ouvir mais uma história de assombração. E pra dormir depois? Só Deus na causa (ou no "causo"). Mas quem diz que no outro dia não estaria ali de novo pra ouvir (e me assustar) com mais um conto?
E até hoje não duvido de todas essas histórias. E é essa que é a graça: o infinito imaginário, sem certeza, cem por cento de nada. A inocência da dúvida.
Como diria Zé Ramalho: "Mistérios da meia-noite que voam longe, que você nunca não sabe nunca..."
Autor: Carlos Eduardo de Souza